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A minha viagem da Horta ao Porto Santo - II

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Por entre os acenos de despedida ao Fernando Nunes, que me albergara ao longo da semana de espera, e ao Zé Branco, que dispusera o seu automóvel para o transporte dos víveres do supermercado para o cais – felizmente, fui às compras com a Astrid e o Achim, caso contrário, nunca me teria apercebido da responsabilidade e da emoção que um ato tão rotineiro pode comportar – o Windlise, sob o comando do Dieter, apartou-se do barco a que estivera acostado enrugando o manto cinzento que amortalhava as águas da marina.
Os cabos e as boias foram recolhidas já ele deslizava.
A bordo, tudo se processava com meticulosa naturalidade à exceção do que a mim respeitava.
Depois de ter passado oito dias a esperar por este momento, assim como a afeiçoar-me ao ambiente que caracterizava aquela marina mais do que qualquer outra, bastou o estremecimento que percorreu o barco da popa à proa com o primeiro ronco do motor para me ver em alvoroço. Por instantes, fiquei sem saber onde terminava a realidade e começava a ficção! Como nunca imaginara, até a imobilidade dos veleiros por que passávamos, concorreu para o estado de irrealidade e espanto em que de repente me encontrei. Após anos e inúmeras ocasiões a vê-los a chegar e a partir ou a passar ao largo, era a altura de também eu partir!...
Sacudindo a apreensão e o nervosismo – fazia-me ao mar alto num barco de treze metros pela primeira vez – pus me de pé e, apoiado a um dos cabos que segurava o mastro, cumprindo uma das instruções do Dieter, eu, qual grumete a bordo do navio escola Sagres, perfilei-me, rendendo-lhes guarda.
Ao contornar por detrás o molhe que resguarda a marina, voltámos a passar, se bem que mais ao largo, pelos meus amigos, Fernando e o Zé, e a saudá-los.
Indiferentes ou habituados a manhãs de outono em pleno junho – a manhã continuava cinzento-escura e até já chuviscara, para deceção minha – tinham subido para a plataforma superior do molhe e, à nossa saudação, respondiam sem preverem a importância de que a presença deles se revestia aos meus olhos. Com efeito, ainda que a brisa e a impressão de o barco balouçar mais fossem indícios claros de me encontrar a bordo, era o testemunho deles a garantir-me a realidade do que estava a acontecer-me na manhã nublada de treze de junho.
Os meus companheiros de viagem tinham sido inexcedíveis no apoio e na atenção que me haviam dispensado. Sê-lo-iam ao longo de toda a viagem. Só que o historial de mar de cada um deles remetia-os para uma realidade distinta da minha, inclusive quando, aparentemente, a partilhávamos, tal como no momento em que todos nós olhámos para a cidade a afastar-se.
O cinzentismo da manhã não lhe favorecia a imagem. As nuvens carregadas ocultavam a metade superior da encosta, impedindo a perspetiva panorâmica e vívida, e ainda assim apreciámos a que nos era facultada. Era bonita, todos nós concordámos, conquanto tenha sido o único a lidar com o efeito desta inesperada impressão: o pedaço de mar que estávamos a atravessar, situado entre o quebra-mar da avenida e o porto, era afinal muito mais extenso do que se me afigurara quando o via a partir da marginal…
O padrão deles era claramente diferente do meu e, por isso, não suspeitaram minimamente de quão intimidante era o desafio que as águas do canal lançavam às que, abrigadas por detrás da muralha do porto, estávamos em vias de deixar…

1 comentário:

  1. Eheh grande Perdigão. Quando passares com o veleiro pela Terceira e amalhares numa das marinas cá da ilha diz qualquer coisa.. e boas viagens!

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